quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Políticas públicas de atendimento ao morador de rua


*Caci Amaral 
Nesta semana, a diretoria do Centro Santo Dias de Direitos Humanos (CSD) recebeu, nas dependências da Cúria Metropolitana, o secretário Rodrigo Garcia, da Secretaria  de Desenvolvimento Social do Estado, a secretária Luciana Temer, recém-nomeada pelo prefeito Haddad para a Secretaria de Assistência e  Desenvolvimento Social, membros do Ministério Público de São Paulo que acompanham a ação do governo na região da cracolândia, Padre Júlio Lancelotti do Vicariato do Povo de Rua, membros da Pastoral do Menor  e o assessor  Pedro Abramovay, para refletir sobre a situação dos moradores de rua,   da região da Luz.
Os debates aconteceram a partir de  duas principais preocupações do CSD:
  1. A necessidade de institucionalizar uma política pública para o atendimento ao morador de rua usuário de droga,  política que relacione  o atendimento primário: isto é o contato com o usuário e o convite para o tratamento, o atendimento seguinte, isto é, o acompanhamento do processo de desintoxicação  com todos os cuidados médicos e sociais que este processo exige, e finalmente o acompanhamento desta pessoa,  até que encontre possibilidade de moradia, trabalho, emprego, convivência social.
  2. A internação dos usuários de  droga.
O secretário Rodrigo Garcia expôs o trabalho da Missão Belém, que em convênio assinado com a Secretaria, em dezembro de 2012, contratou 56 ex - viciados para contatar moradores de rua usuários de drogas e, por meio de conversa e amizade, fazer o convite para  acolhimento e tratamento  nas casas da Missão Belém, entidade católica dirigida pelo padre Gian Pietro.
Trabalho de longo prazo, os presentes consideraram a necessidade de parcerias entre as diversas secretarias e as entidades que atendem os usuários, de modo a prever leitos hospitalares, vagas em centros de tratamento, atendimento social que resolva o problema da moradia e do emprego, permitindo uma nova convivência para o antigo usuário de droga.
Especialista no tema, Pedro Abramovay descartou, com base em estudos realizados no Brasil e no exterior, a internação obrigatória de usuários como foco principal de uma política pública de atendimento ao usuário de droga, morador de rua. Foi acompanhado neste entendimento pelos presentes que, em seus depoimentos,  reforçaram a absoluta inutilidade deste tipo de internação, o fracasso da experiência neste sentido que acontece no RJ e a violência que representa contra a dignidade do ser humano.
Pedro Abramovay também  deixou claro que há disponibilidade de verba  do governo federal para uma atuação significativa junto aos moradores de rua, principalmente aos usuários de drogas, bastando para isso que as secretarias municipais e estaduais apresentem seus projetos.    
A necessidade de um comitê, abrigado preferencialmente junto às secretarias de assistência social, articulando diversas secretarias e coordenando as ações necessárias ao atendimento de médio e  longo prazo, realizando trabalho conjunto entre a União, o Estado e o Município e entidades da sociedade, até a completa possibilidade de convivência social da pessoa, foi conclusão unânime entre os participantes do encontro.
Os seguintes pontos também foram consenso:
  • No atendimento ao morador de rua o fundamental é o contato pessoal, a convivência, a perseverança e a esperança na capacidade do ser humano de se redescobrir  na sua dignidade.
  • O atendimento ao morador de rua é um trabalho emergencial e exige ações também emergenciais, isto é, que não fiquem a espera de decisões da burocracia estatal.
  • O atendimento ao morador de rua é um trabalho a médio e longo prazo. Não se pode esperar resultados imediatos.
  • O atendimento ao morador de rua usuário de crack não pode ter como foco principal a internação. Quando houver necessidade de internação, esta será sempre de caráter voluntário. Internação compulsória, obrigatória, não pode ser jamais, prioridade de política publica de atendimento ao drogadito.
  • O atendimento ao morador de rua não pode se concentrar apenas na região da Luz: é preciso uma expansão desse atendimento para todas as regiões da cidade, inclusive para outros municípios da região metropolitana de SP.
  • O atendimento ao morador de rua é um trabalho social e a polícia militar não deve participar de abordagens.
  • No atendimento ao morador de rua o papel da polícia militar e da guarda municipal limita se a função policial: presença preventiva, à distância, visando cuidar da segurança dos moradores de rua e dos agentes que trabalham na rua.
  • No atendimento aos moradores de rua há experiências exitosas que precisam ser  estudadas, verificando se a possibilidade de serem aplicadas na cidade de SP.
  • No atendimento ao morador de rua, por exemplo, naquele realizado nas Tendas instaladas na região da Luz, as secretarias de Assistência Social, Saúde, Habitação e Trabalho devem atuar integradas às entidades sociais.
  • Para os presentes ficou a constatação de que a grande  imprensa, jornais, rádios e televisão,  reflete e reforça a  cultura  higienista e policial  em relação ao morador de rua e ao usuário de droga,  mentalidade presente na  sociedade e no Estado.
Para  nós cristãos  e cristãs que  professamos nossa fé em Deus Pai que nos ama e nos faz  irmãos e irmãs de Jesus Cristo permanece a pergunta: o que estamos fazendo para mudar esta mentalidade que enxerga o morador de rua como um caso de polícia? 
* Coordenadora da Pastoral Fé e Política da Arquidiocese de São Paulo
Programa exibido na Rádio 09 de Julho em 08/01/2013.

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