quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Não ao Genocídio dos Povos Indígenas.

Porque pedimos o embargo/boicote aos produtos do agronegócio de Mato Grosso do Sul
- Mato Grosso do Sul tem a segunda maior população indígena do Brasil, cerca de 77 mil pessoas, e é palco da maiores e mais graves violações dos direitos humanos do Brasil e do mundo: casos de tortura, estupros, espancamentos, ataques armados e  assassinatos praticados por milícias de jagunços e organizações paramilitares contratadas por fazendeiros, além dos altos índices de desnutrição e suicídios.   Está em curso um verdadeiro genocídio*, especialmente do povo Guarani-Kaiowá.

- Nos últimos 12 anos, foram registrados mais de 400 assassinatos. O Estado concentra mais de 60% dos casos de assassinatos de indígenas do país e 586 suicídios. Em 2010, por exemplo, a taxa de homicídios na aldeia Guarani-kaiowá do município de Dourados, é maior do que a registrada no Iraque. Conforme já anunciou o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, temos aqui uma Faixa de Gaza.  Se no Iraque a proporção é de 93 assassinatos para cada 100 mil pessoas, na aldeia de Dourados é de 145 assassinatos, 495% maior do que a média nacional.

- Apenas em 2014 o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), registrou 138 casos de assassinatos e 135 casos de suicídios no país, sendo que destes 41 assassinatos e 48 suicídios aconteceram no Mato Grosso do Sul. Os dados também revelam um severo aumento das mortes por desassistência à saúde, mortalidade na infância, invasões possessórias e exploração ilegal de recursos naturais e de omissão e morosidade na regularização das terras indígenas.

·  Nos últimos 60 dias, foram registrados mais de quinze ataques contra cinco comunidades indígenas de Mato Grosso do Sul,  os quais foram promovidos por fazendeiros, suas milícias armadas e, de acordo com  denúncias dos indígenas, sob proteção de aparato policial do Estado. Além da morte do líder indígena Simeão Vilhalva, no Tekoha  Ñanderu Marangatu, no município de Antônio João, esses ataques deixaram três indígenas baleados por arma de fogo, dois jovens desaparecidos que podem estar mortos, vários feridos por balas de borracha e dezenas de torturados e espancados, inclusive, crianças, mulheres e idosos. Chegamos ao ponto de, conforme denunciam os indígenas, um boi no pasto ter mais valor do que a vida de uma criança indígena.

- A violência contra os povos indígenas e o genocídio em curso está vinculado a três fatores que se relacionam:
1. A violação dos direitos individuais e coletivos está intrinsecamente ligada ao processo histórico de colonização e ocupação do Estado de Mato Grosso do Sul e ao modelo econômico que foi escolhido pelo Estado brasileiro, o qual foi implantado à base da violência, do confinamento dos povos originários e  do desrespeito aos seus direitos fundamentais. Sem cumprir as determinações constitucionais e tratados internacionais dos quais é signatário, mantendo-se omisso na demarcação e homologação das terras indígenas,  não assegurando direitos humanos e territoriais dos povos indígenas, o governo brasileiro se tornou o principal responsável por esta realidade de violência. Em Mato Grosso do Sul são mais de 50 áreas em situação de conflito, aguardando demarcação e homologação das terras indígenas, conforme determina a Constituição Federal. Enquanto o rebanho bovino de Mato Grosso do sul ocupa 23 milhões de hectares de terra, a etnia Guarani-Kaiowá, é constituída por 45 mil pessoas, ocupa apenas 30 mil hectares de suas terras tradicionais. Se todas as áreas reivindicadas por eles como territórios indígenas forem demarcadas, elas representam cerca de apenas 2% da área total do estado.
2. A atuação institucional e organizada dos ruralistas que, por meio das suas instituições classe, tem estimulado o enfrentamento aos povos indígenas. A gravidade da situação chegou ao ponto de, acintosamente, em 2013, a Acrisul e a Famasul  anunciarem e realizarem o Leilão da Resistência para arrecadar recursos para este tipo de enfrentamento, o qual contou com a participação de fazendeiros e políticos. Ação que mereceu repúdio internacional e cujos recursos financeiros arrecadados foram embargados judicialmente.
3. A impunidade é outro elemento central na perpetuação da violência e do genocídio.  Executores de homicídios, de ataques, de casos de tortura e espancamentos, bem como os seus mandantes, raramente são identificados e, sequer, vão para os bancos dos réus, prevalecendo a impunidade. Se por um lado a impunidade reina para os que massacram os povos indígenas, por outro há uma tentativa de criminalizar as entidades indigenistas e as lideranças indígenas, por meio de uma Comissão Parlamentar de Inquérito contra o Conselho Indigenista Missionário (CIMI).          
A partir deste  grave cenário de genocídio*, da  violência em  série praticada pelos ruralistas, de omissão e descaso dos poderes públicos  e impunidade;  com base nas determinações da Carta Magna, Constituição Federal, em especial ao direito à vida, que é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos; com base na Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio (1948) e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas e demais tratados, dos quais o Brasil é signatário; nós, entidades e organizações indígenas, sociais, religiosas, sindicais e culturais, inspirados nos movimentos da não violência indiano, liderando por Gandhi, de Antiapartheid, liderado por Nelson Mandela,  e dos trabalhadores rurais nas plantações de uva nos Estados Unidos, liderado por  César Chavez, apoiamos a decisão do Conselho do Povo Terena e do  Conselho Aty Guassu do Povo Guarani-Kaiowá de convocar uma campanha legítima de boicote mundial à compra e consumo dos produtos do agronegócio sul-mato-grossense, os quais são produzidos em territórios marcados pelo genocídio dos povos indígenas.
            É uma campanha para que os organismos internacionais embarguem os produtos do agronegócio até que o governo brasileiro resolva definitivamente esta questão, demarcando e homologando as terras indígenas, indenizando os proprietários das áreas cujos títulos foram adquiridos de boa fé, cessando todos os ataques e atos de violência contra os povos indígenas. É uma campanha pela paz.

ASSINAMOS:

CEBI - Centro de Estudos Bíblicos
O RUA - Juventude Anticapitalista
MMC - Movimento de Mulheres Camponesas
CUT - Central Única dos Trabalhadores
CIMI


*Lei do Genocídio-  LEI Nº 2.889, DE 1º DE OUTUBRO DE 1956. Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal: a) matar membros do grupo; b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo; c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial;d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo;