Pedro Aguerre*
A segunda-feira 10 de Dezembro foi o dia que marcou
os 64 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos. A data foi saudada pelo
Padre Julio Lancelotti de forma simples e direta como o dia em que direitos foram
assegurados a todo ser humano, independentemente de classe, poder, raça, religião,
sexo, direito assegurado a todo ser humano por sua dignidade e natureza. Esta
foi a saudação do querido padre da população em situação de rua.
E ter direitos assegurados é fundamental, pois é a
pedra sobre a qual se erige a luta pela dignidade humana. Ao estarem
consagrados em um pacto de todos os povos, permite a todo e qualquer cidadão do
mundo, identificar as situações em que há violações e, assim, denunciar e lutar
pela garantia e efetivação desses direitos. Mas eles não estão garantidos nem
são reconhecidos por todos como mínimos de cidadania. E sempre há riscos de
retrocessos, como alguns projetos que tramitam em Brasília nestes dias e
pretendem abrir espaço para a redução da maioridade penal, abrindo a
possibilidade de ainda maior criminalização dos jovens.
A realidade brasileira quanto ao respeito aos
direitos humanos é muito ambígua, pois, por um lado, o país reconhece as
convenções e pactos que estabelecem direitos a nível global e conseguimos
inscrever um grande conjunto de direitos na Constituição. Mas, por outro lado,
só seu reconhecimento não os garante, e nem gera a cumplicidade por parte da
maioria da sociedade, da mídia, das empresas e dos partidos políticos. E, em
especial, a falta de informação sobre estes assuntos contribui por criar uma
cultura favorável às violações, como por exemplo, a violência contra a mulher,
ainda brutal, apesar dos avanços com a Lei Maria da Penha. Faltam campanhas e
falta informação a respeito.
Para destacar dois exemplos, pouco tem sido
combatida a escalada de violências e violações de direitos contra homossexuais
da comunidade LGBT, e continua o genocídio dos jovens, sobretudo os jovens
negros no país e, de forma especialmente terrível, na cidade e no estado de São
Paulo.
No comentário de hoje, ao invés de dados
estatísticos ou mais exemplos recentes da violência homicida que a população,
especialmente nas periferias, tem sentido na pele, falaremos da cerimônia de
entrega do Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos em sessão solene da Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo, na última segunda-feira. Na premiação deste
ano, presidida pelo Deputado Adriano Diogo, um dos premiados foi Mano Brown,
grande nome do rap brasileiro e vocalista dos Racionais MC’s. Também foi
escolhida a organização Educafro, liderada pelo Frei Davi, que atua na luta por
ações afirmativas concretas para os jovens negros e a inclusão destes nos
diversos espaços sociais. Entre os premiados, estava também o jornalista André
Camarante, que não compareceu à cerimônia, pois deixou o país após o coronel e
vereador eleito Paulo Telhada incitar seus seguidores no Facebook contra ele, em uma reação a uma curta reportagem sobre o tipo
de mensagens que ele trocava no facebook, de estimulo à violência. Num momento
de grande emoção Maria da Conceição dos Santos, mãe de uma vítima de grupo de
extermínio, recebeu o prêmio em nome do jornalista André Camarante da mão de
uma dezena de jornalistas e defensores de direitos humanos, em sinal de
solidariedade e repúdio contra as ameaças que não só afligem a ele e sua
família como também impedem o direito à informação na sociedade.
A premiação deste ano foi marcada pelo
reconhecimento da atuação de defensores que atuam na periferia, na denúncia
contra a discriminação racial, denunciando a violência e o genocídio da
juventude, negra e pobre da periferia, que lutam pelo reconhecimento da
dignidade dessa população e seu direito a ter direitos. Direitos não apenas no
papel, mas de fato, como o direito a poderem cursar a Universidade pública em
São Paulo, seguindo diversas experiências em curso no País.
O líder do Racionais MC´s também denunciou o
genocídio dos jovens negros na periferia da capital paulista e, em particular,
questionou a autoridade política do Governador do Estado, por ação e omissão,
no que diz respeito à violência por parte de policiais ou suspeitos grupos de
criminosos. O Movimento Mães de Maio também participou da solenidade. A sua
líder, Débora Maria da Silva, denunciou: “A gente vê os massacres diariamente e
grita por um basta, mas os crimes não são investigados, são todos arquivados.
As autoridades não assumem que existe, dentro das instituições, grupos de
extermínio. Eles não querem admitir que existe uma higienização da pobreza.”
Também receberam o prêmio o jornalista Leonardo
Sakamoto, da ONG Repórter Brasil, que se dedica à luta contra o trabalho
escravo e tráfico de seres humanos. Receberam menções honrosas Daniela Skromov
de Albuquerque, da Defensoria Pública de São Paulo; Ariel de Castro, presidente
da Fundação Criança de São Bernardo do Campo; a militante do movimento negro
Sonia Aparecida dos Santos (in memoriam); o Movimento Nacional de Direitos
Humanos (MNDH); e o jornalista Danilo Manha. O
Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos foi instituído em 1996, e
visa reconhecer o trabalho de pessoas ou entidades em defesa dos direitos
humanos.
Para concluir, entendemos que a violência é apenas
uma parte do problema, talvez a origem esteja exatamente nas violações aos
direitos humanos das populações em nossa sociedade. As violações do direito à
educação, à saúde, os diversos direitos ausentes nas periferias, refletem a
falta de atendimento digno de todas e todos por parte de todas as agências do
Estado, e, em especial, o direito à não discriminação, ao reconhecimento das
particularidades de cada um, pelo Estado e pela sociedade.
Ainda parece distante a superação deste momento tão
dramático na vida da cidade, que se espalhou por várias outras regiões do
Estado, com indícios e suspeitas de participação institucionalizada não só de
policiais, mas também de conivência institucional. São necessárias mais e
urgentes providências por parte das autoridades da área após a inadiável
mudança de comando da segurança pública. Embora esta seja uma tragédia que
dificilmente aconteceria se outros direitos estivessem não só reconhecidos, mas
também assegurados, é preciso mais transparência nas informações, melhor cobertura
da mídia e maior presença da opinião pública exigindo providências imediatas.
Visite o blog da pastoral fé e
política http://pastoralfp.blogspot.com/ especialmente a seção Cidadania Ativa!!
*Professor da PUC-SP, colaborador da Pastoral Fé e Política e da Escola
de Governo de São Paulo.
Programa exibido na Rádio 9 de Julho em 12/12/12.
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