sexta-feira, 13 de julho de 2012

Eleições e Ousadia

Caci Amaral*

A eleição vem aí! 
E o inverno chegou trazendo logo no seu início muita chuva e frio. Que tal um chocolate quente, uma casa acolhedora, um sofá, filmes, música, um programinha na TV? Melhor que isso, a saborosa sopa  acolhendo  aos que da  chegam da rua, com frio e fome.
Mas, a cidade de São Paulo, que se prepara para as eleições e para o inverno se esqueceu dos milhares de pessoas que moram nas ruas. Poucos jornais  noticiam,  a televisão não mostra, mas ao passar pelas ruas, praças,  viadutos e avenidas você os enxerga: em pequenos grupos, enrolados, cobertores  cinzentos, tentando se acomodar para enfrentar a noite. São milhares deles e pouquíssimos locais de acolhida, em geral distantes, fora  do trajeto das pessoas que moram nas ruas.
As eleições vêm aí!
O partido do prefeito conseguiu que o Supremo Tribunal Federal autorizasse tempo de propaganda na TV, durante o horário político gratuito,  além do recebimento de verba do Fundo Partidário.  Dinheiro e tempo de TV colocados à disposição dos partidos coligados com o PDS, Partido Social Democrático.
Mas, fica a pergunta: e o dinheiro para atender a população de rua, para sua educação, atendimento à saúde, a construção e manutenção de abrigos, convênios com entidades sociais que os  atendam com dignidade e projetos de melhoria da sua qualidade de vida?
Maria José e Jesus da Silva também sonham com um café quente ao final da tarde. Além de morar na rua, Maria José e Jesus da Silva ficaram sem o café e passaram um susto ao ouvir a notícia sobre a suspensão do fornecimento do sopão. Foi apenas um susto! Que teve origem em notícia publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, a partir de declaração, já adianto, desautorizada pelo prefeito, do seu Secretário de Segurança Urbana, Dr. Edson Ortega: a prefeitura iria impedir  a distribuição de refeições para os moradores de rua, pelas entidades beneficentes.
Há pessoas que desejam não ver os moradores de rua: consideram que devem ser retirados das praças e avenidas, alegando que estas devem estar desimpedidas para a livre circulação dos transeuntes. Defendem a  liberdade de ir e vir, sem transtornos nem  sustos, pois vem nos moradores de rua ameaça a sua integridade física. Pouco se lhes importa para aonde e em que condições serão removidos!  O que interessa é  que sumam da vista das pessoas ditas “pessoas de bem”. Interessa uma cidade limpa!
O promotor de Justiça, para as áreas de habitação e urbanismo da cidade de São Paulo, Dr. Mauricio Antonio Ribeiro Lopes, em recente artigo no jornal A Folha de S. Paulo, perguntava, ao se referir aos moradores de rua e às manifestações contrárias a presença  dos mesmos nos largos, praças e avenidas: “para quem é inaceitável a situação de rua? Para os incomodados com a própria miséria ou para os que são incomodados com a miséria alheia?”
O promotor continua: “Somos os últimos a defender que nada deve ser feito. Mas, quando é imperioso que se faça alguma coisa, exatamente como no caso da cracolândia, não podemos nos contentar quando se faz qualquer coisa  - e não devemos aceitar quando se faz a pior coisa”.
“Atentar contra a liberdade (dos moradores de rua, impedindo-os de andar e se acomodar pelas ruas da cidade) sem oferecer uma política pública que satisfaça realmente os anos de abandono social não é medida que se deva ousar pensar, ousar dizer e menos ainda ousar escrever”.
Na cidade, segundo dados da  Rede Nossa São Paulo, estavam morando na rua  ou em situação de rua,  13. 866 pessoas e informações da Agenda 2012 da prefeitura de São Paulo dão conta de que  estão à disposição dessa população 14 Centros de Serviço de higiene pessoal da população de rua.
Como você, a família, vizinhos e a comunidade reagem à presença dos moradores de rua? Os moradores de rua atendidos pela paróquia são incentivados e preparados para  participar das ações que lhes dizem respeito? Ou, apenas objeto da caridade assistencialista que não transforma suas vidas? 
Teremos sensibilidade, discernimento e solidariedade suficiente para compreender a situação extrema em que vivem? Temos  propostas de políticas públicas construídas junto com os  grupos que convivem com esta realidade e junto com a população de rua? Construídas de forma participativa,  com criatividade e ousadia, considerando os moradores de rua  sujeitos políticos  capazes  de se autodeterminarem?
Qual a posição dos partidos políticos e de seus candidatos para a questão? O que pensam sobre o tema os candidatos que procuram a comunidade para pedir apoio e votos?
Pesquise e aprofunde o tema na comunidade. Procure o Vicariato do Povo da Rua, serviço pastoral da Arquidiocese de São Paulo, que acolhe moradores de rua na Casa de Oração do Povo de Rua, telefone 3228-6223.
Que o Espírito Santo nos dê sabedoria para escutar a Jesus que nos fala pelos fracos e empobrecidos. 

*Coordenadora da Pastoral Fé e Política da Arquidiocese de São Paulo
Programa apresentado pela PFP na Rádio 9 de Julho em 06/07/2012 

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