quarta-feira, 27 de junho de 2012

Breve avaliação da Rio + 20 e da Cúpula dos Povos: impasses e desafios na construção de um modelo de desenvolvimento sustentável para o Planeta

Pedro Aguerre*
Finda a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio + 20 e a Cúpula dos Povos, múltiplo evento da sociedade civil que ocorreu em paralelo à Conferência, é hora de buscarmos alguns elementos de avaliação deste grande evento mundial organizado pelo governo brasileiro e pela Organização das Nações Unidas. Muito já foi dito e veiculado pelos meios de comunicação. Um evento múltiplo também mereceu as mais diversas análises e conclusões por parte dos analistas.
Uma primeira constatação indica que o conjunto de eventos e atividades foi bem sucedido do ponto de vista organizativo, mostrando, por parte do Brasil, boa capacidade de organizar e realizar eventos de grande porte, o que também foi verdadeiro do ponto de vista da qualidade da articulação diplomática entre governos. Na qualidade de anfitrião e país responsável pela elaboração do texto-base, o país mostrou responsabilidade e civilidade. O ministro Gilberto Carvalho afirmou que a presidente Dilma elogiou o trabalho dos diplomatas brasileiros: “um documento da ONU [Organização das Nações Unidas] é de costura muito difícil, basta um país dos 192 da ONU se recusar a assinar e não haveria documento. Há que se valorizar muito esse trabalho e essa competência da nossa diplomacia”, disse o ministro.
Da mesma forma, cabe destacar a participação da sociedade civil na Rio+20 e a pacificidade das manifestações durante as duas semanas da Conferência. “Foi uma festa democrática, afirmou ainda o Ministro, “com absoluta liberdade”. “O governo foi para o diálogo, abriu as portas e ajudou a organizar essa mobilização”.
Ciente da percepção geral de que o documento foi considerado tímido e incapaz de avançar em vários objetivos reivindicados por grande parte da opinião pública global afirmou, ainda que o documento assinala uma “mudança de cultura e dos objetivos de desenvolvimento sustentável”, e que, justamente por isso, a Rio+20 vai ter que ser julgada, avaliada, pelo conjunto das mobilizações e dos debates que ela encerrou: seria muito pobre reduzir a Rio+20 apenas àquilo que é o documento final”, ressaltou.
Do ponto de vista da sociedade civil, olhando na perspectiva do bem estar social no Planeta, o artigo Rio+20 ou Rio-20?, Iara Pietricovsky traz uma síntese do trágico quadro socioambiental global: “Constatamos que existem mais de um bilhão de pessoas ameaçadas de morrer de fome, que a distância entre ricos e pobres está aumentado, com 70% dos recursos mundiais desfrutados pelos 20% mais ricos, enquanto que aqueles no quintil inferior ficam somente com 2%. Comprovamos uma ausência de vontade política dos países mais ricos em mudarem seu padrão de consumo, estilo de vida, porque em grande medida é disso que se trata, os mais ricos são os maiores responsáveis por este padrão que se mostra esgotado e em crise.  
Em síntese, segundo essa análise, a Conferência mostrou “lacunas e falta de vontade política no momento de colocar em prática os acordos internacionais, a Agenda 21, os Princípios do Rio, que saíram das Rio 92”. A nossa crise, conclui o artigo, é de implementação e não de ausência de um marco decente para que possamos fazer a mudança de modelo de desenvolvimento. É uma tensão política e econômica, onde os algozes, defensores de um modelo predatório, insistem em sua sobrevivência e hegemonia.
Pelo menos dois avanços que estavam no horizonte infelizmente não se materializaram. Além de não se criar um fundo específico para ações de desenvolvimento sustentável, a proposta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável deveria estar vinculada aos Princípios de responsabilidades comuns, porém diferenciadas, ou seja, país poluidor, país pagador, evitando-se maiores dificuldades para o desenvolvimento dos países com altos índices de pobreza.
Por esses motivos a declaração final da Cúpula dos Povos – sintetizada em um documento de quatro páginas e 20 parágrafos - ataca a mercantilização da vida e faz a defesa dos bens comuns e da justiça social e ambiental. Além disso critica fortemente as instituições financeiras multilaterais, coalisões como o G8 e G20, as Nações Unidas e a maioria dos governos, “por demonstrarem irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do planeta”.
Festejada como principal achado teórico por muitos líderes mundiais e empresários na Rio+20 “a dita economia verde, foi desqualificada pelos participantes da Cúpula, por não se opor nem mostrar capacidade de superar a atual fase de crise financeira do capitalismo, questionando o super-estímulo ao consumo e a apropriação privada das novas tecnologias.”
Semelhante foi a opinião formulada pela CNBB – Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, considerando a Rio +20 um retrocesso quando comparada aos resultados obtidos na RIO 92. Seu Secretário Geral, dom Leonardo Steiner, afirmou que a economia verde defendida pelas autoridades governamentais foge do debate central de desenvolvimento de uma política ambiental que promova o crescimento sustentável: “A Rio+20 indica uma resposta a essas questões com a chamada economia verde. Se esta, em alguma medida, significa a privatização e a mercantilização dos bens naturais, como a água, os solos, o ar, as energias e a biodiversidade, então ela é eticamente inaceitável”, diz o documento final do conselho.
Ele estendeu a critica à discussão da Medida Provisória do Código Florestal, em análise no Congresso citando, por exemplo, o tratamento dado pelo governo à preservação de matas ciliares nas margens de rios, riachos e córregos: “Isso não tem avançado”.
Terminamos com uma citação do Documento final da Cúpula dos Povos por Justiça Social e ambiental em defesa dos bens comuns, contra a mercantilização da vida:
“A Cúpula dos Povos é o momento simbólico de um novo ciclo na trajetória de lutas globais que produz novas convergências entre movimentos de mulheres, indígenas, negros, juventudes, agricultores/as familiares e camponeses, trabalhadore/as, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, lutadores pelo direito a cidade, e religiões de todo o mundo. As assembléias, mobilizações e a grande Marcha dos Povos foram os momentos de expressão máxima destas convergências.”
A conclusão da Declaração mobiliza os povos a continuarem organizados, e a levarem aos seus territórios e países a mensagem de luta contra os malefícios do atual modelo capitalista em crise, e por um modelo de desenvolvimento social e ambientalmente sustentável para toda a humanidade!
*Professor da PUC-SP, colaborador da Pastoral Fé e Política e da Escola de Governo de São Paulo
Programa apresentado na Rádio 9 de julho em 27/06/2012. Um espaço da Pastoral Fé e Política em vista da informação para a consciência crítica e à cidadania ativa,

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