Dando continuidade ao comentário da semana passada,
seguimos com a repercussão do conjunto de atividades organizado em torno da
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que vem sendo
bastante repercutida pelos meios de comunicação. Eu tive a grande satisfação de
ter comparecido ao Rio de Janeiro no último fim de semana, representando a
Escola de Governo de São Paulo, para a Cúpula dos Povos, múltiplo evento da
sociedade civil que ocorre em paralelo à Conferência.
A Conferência inicia-se hoje, e desde ontem vem
sendo noticiada a aprovação do texto-base, tarefa coordenada pelo Brasil, o
anfitrião do Evento. Muita polêmica se instaurou, em relação ao conteúdo do
texto, repercutindo o fato já sabido que não seria nesta Reunião Global que
realmente se teria condições de firmar um compromisso pelo desenvolvimento
sustentável, realmente transformador, seja pelo mau momento de crise global,
seja pelo fato de que se trata de um assunto em que é muito difícil construir
consensos. O País foi criticado por insistir na redução da pobreza ao invés de
fortalecer uma nova visão de desenvolvimento responsável do ponto de vista
ambiental. Organizações não governamentais criticam a falta de ousadia. Ficou
indicado como um avanço a criação de um acordo em torno da construção de Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável, que venham a permitir monitorar as ações
futuras em relação aos recursos naturais, aos sistemas produtivos, aos
contextos sociais. De qualquer forma, caberá aos chefes de Estado reunidos,
concluir as negociações e firmarem os acordos previstos.
Entre os eventos paralelos, uma reunião importante
foi a do grupo C-40, que reúne as 59 grandes cidades do mundo, que estabeleceu
um compromisso de reduzir em 45% as emissões poluentes previstas para 2030,
sugerindo que poderiam obter uma redução de gases de efeito estufa lançado na
atmosfera da ordem de 1,3 bilhão de toneladas.
Na mesma linha, a questão urbana esteve presente no
Painel da Rio + 20 Cidades Sustentáveis – Oportunidades para Empreendedores
Sociais, realizado na tarde do domingo 17 em um auditório construído no Forte
de Copacabana e que teve a participação da Rede Nossa São Paulo, Rede
Latinoamericana por Cidades Justas, Democráticas e Sustentáveis e do Movimento
Nossa Zona Leste. Mais de 600 pessoas se aglomeraram para acompanhar os debates
nesse Painel.
Pela rede Nossa São Paulo, Oded Grajew, apresentou
o Programa Cidades Sustentáveis e abriu a discussão reforçando o papel
estratégico das cidades no fortalecimento de um novo modelo de
desenvolvimento, ao dizer: “O jogo da sustentabilidade vai se decidir nas
cidades. É nas cidades que se consomem as energias, os produtos, os serviços. É
onde moram as pessoas. O que vai acontecer nas cidades é o que vai acontecer no
planeta. Meu objetivo hoje é fazer com que cada um de nós saia daqui com a
missão, com a possibilidade de participar e de agir para isso. Aqui é um
encontro de empreendedorismo social, e isso significa cidadania ativa, na
prática. Esse é o nosso objetivo”.
Luis França, um dos fundadores do Movimento Nossa
Zona Leste também presente lembrou que a sua região tem cerca de 4 milhões de
habitantes e reforçou a importância do Programa de Metas de São Paulo e da
importância de indicadores claros para a gestão pública ao dizer que o
movimento, frustrado pelo pequeno atendimento de metas previstas já levantou
mais de 300 novas metas que serão apresentadas aos candidatos nas eleições
deste ano.
Esteve também presente a esse debate o respeitado
professor português, Boaventura de Sousa Santos, muito aplaudido ao afirmar que
“A cidade é o território fundamental dos bens comuns. Nos níveis nacional e
global não temos tido inovação". Ele também afirmou: “Não há cidades
sustentáveis sem desenvolvimento sustentável. E não há desenvolvimento
sustentável com a obsessão do crescimento infinito e do consumo desenfreado.
Estamos em sociedades capitalistas, claro, mas precisamos proteger e promover
as economias solidárias. Os catadores de lixo não são lixo, mas vivem em
condições sub-humanas, As cidades têm a responsabilidade de criar os tempos da
convivência, os tempos do encontro, o tempo do espaço público”. E
concluiu: “As pessoas precisam ser envolvidas. Não há cidade sustentável sem
envolvimento sustentável”.
Estas reflexões do Professor Boaventura de Souza
Santos tornam evidente a crítica à proposta da Rio + 20 quanto a uma economia
verde, quando ainda se está tão distante do valor do desenvolvimento
sustentável e o mundo ainda se mede em crescimento, sem atenção para as
consequências desse modo de vida predatório.
Mas o que mais me marcou foi a imagem da cidade do Rio
de Janeiro, que mais parecia o cenário da convivência dos 1000 povos! Dezenas
de nações indígenas brasileiras, movimentos sociais e delegações de países,
vestidos e adornados segundo seus costumes e culturas. Grandes reuniões para
debater as grandes obras e a busca de transparência e maior atenção aos
impactos sociais, por exemplo as críticas à construção da usina de Belo Monte.
O Instituto de Desenvolvimento Sustentável, liderado por Marina Silva, marcou
posição para evitar novos retrocessos quanto ao código florestal.
A Cúpula dos Povos, ocorre de 15 a 23 de junho e
continua mais uns dias denunciando o caráter predatório e anti-justiça social
do atual modelo econômico global. Nesta enorme reunião, como dissemos na semana
passada, organizações não governamentais, movimentos sociais e coletivos de
inúmeros países desenvolvem atividades de discussão do desenvolvimento
sustentável com base na Justiça social e ambiental.
Por fim, esteve presente a Coalizão por um Brasil livre de Usinas Nucleares, denunciando as condições das usinas no Brasil,
denunciando os riscos da continuidade dessa perigosa escalada de utilização da
energia nuclear em nosso país.
E encerro este comentário de hoje, relatando o momento
para mim mais emocionante, que foi o relato da comissão de representantes da
tragédia ambiental e nuclear ocorrida em Fukushima, há apenas um ano atrás. Por
meio de uma delegação de dez pessoas, entre jornalistas, agricultores e
familiares de vítimas, fomos mobilizados para a importância de refletir para as
drásticas consequências dos acidentes com este tipo de energia que se torna quase
impossível reparar, tão complexos, dispendiosos, mesmo para uma sociedade
desenvolvida como o Japão. Uma vivência realmente emocionante.
E vale a pena visitar o site da Cúpula
dos Povos no link http://cupuladospovos.org.br/
São centenas de eventos ali divulgados, que podem ser conhecidos por todos,
permitindo conhecer um pouco mais da atuação da sociedade civil mundo afora na
construção de alternativas sustentáveis dentro de um sistema político e social
global que ainda não encontrou as utopias do bem viver.
Visite o blog da pastoral fé e política http://pastoralfp.blogspot.com/ especialmente a seção Cidadania Ativa.
*Professor da PUC-SP, colaborador da Pastoral Fé e Política e da Escola de Governo de São Paulo
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