Gostaria de introduzir aqui um outro assunto muito relevante, e que está bem afinado com o propósito geral dos comentários que aqui fazemos! Iniciaremos uma discussão sobre a cidade de São Paulo e as formas de gestão municipal. Às vésperas da definição dos candidatos e do início de mais uma disputa eleitoral, desta vez para prefeitos e vereadores, torna-se importante discutir as características e a forma de condução da cidade, aquela que não é só uma das maiores cidades do planeta e que constitui o centro dinâmico da economia brasileira, mas que é a sede de uma ampla região metropolitana, de 39 municípios. Aliás, mais recentemente a denominação região metropolitana tem se mostrado insuficiente para caracterizar o dinamismo da mancha urbana, dando lugar ao conceito de macrometrópole, devido ao seu espraiamento em todas as direções, para o vale do Paraíba, região de Campinas e de Sorocaba, além da proximidade com a região da Baixada Santista e o litoral paulista.
Entre os grandes desafios colocados, certamente está o da construção de canais e instrumentos de gestão metropolitana, fomentando a ampliação da integração com o Estado e entre os municípios, iniciativa que tem tido alguns avanços importantes no último ano. Esta estratégia mostra-se fundamental para buscar formas de melhoria da mobilidade, de integração dos transportes públicos, das políticas de saneamento básico, podendo chegar também, entre outras, às políticas de saúde, educação e habitação. Muitos analistas dizem que num futuro não muito distante, teremos que caminhar em direção a uma autoridade metropolitana, com prerrogativas claras e orçamento próprio. De fato, são mais de 20 milhões de pessoas morando nesta região, muitas vezes em bairros que se situam nos limites de diferentes municípios, fazendo com que nem sempre todos tenham os mesmos direitos e possibilidades.
Cidade plena de significado histórico, São Paulo é conhecida, entre tantos momentos importantes, pelo fato de ter sido a sede da Semana Modernista de 1922, que renovou as artes e a visão da cultura nacional. Seus 11 milhões de habitantes atuais são o resultado de um processo conhecido como de inchaço urbano. Cidade cosmopolita, dos mil povos, como é chamada, possibilitou a presença de comunidades de pelo menos duas dúzias de países, vindos ao longo de todo o século passado, de todos os continentes. A cidade observou intensa migração nos anos 1960 a 1980 de habitantes provenientes de estados como Bahia, Pernambuco, Minas Gerais, entre outros. Enormes contingentes vindo muitas vezes de “pau-de-arara”, deixaram para trás seca, miséria e uma situação social terrível devido à predominância de latifúndios pouco produtivos, os novos habitantes logo se incorporaram ao mercado de trabalho, seja na indústria ou na construção civil. Contudo, tudo isto ocorreu bem no período ditatorial, período que se caracterizou por uma ausência generalizada de políticas sociais e de políticas públicas de integração social ocasionando a ocupação desordenada, a ocupação de loteamentos irregulares, favelas, em bairros improvisados, sem infraestrutura e distantes do centro, com poucas e precárias alternativas viárias e de transportes. E esta situação reforçou a grande desigualdade social e econômica, acentuando a pauperização e dificultando o acesso a bens e serviços de qualidade.
No último dia 3 de maio a Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, por iniciativa do vereador Carlos Neder, realizou o seminário ““Distritalização de São Paulo – 21 anos da divisão territorial da cidade”. Este evento possibilitou refletir sobre os rumos da gestão pública da cidade nos últimos anos. Uma das conclusões é que houve uma reversão da descentralização político-administrativa que estava em pleno curso na Cidade de São Paulo, o que teria levado a um grande esvaziamento das subprefeituras, que são os órgãos de gestão mais próximos da população. A professora e ex-vereadora Aldaíza Sposati, ao final do seminário considerou “decepcionante constatar que os antigos administradores regionais tinham mais poder dos que os subprefeitos atuais”. De fato, ocupadas por policiais militares de alta patente, parece que as subprefeituras voltaram a ser apenas zeladorias, sem compromisso com o atendimento da população, nas diversas políticas públicas. E mais, seu orçamento foi minguando, sendo novamente centralizado, revelando o afastamento do poder público da população. Como disse o padre Jaime Crowe, participante de uma das mesas e um dos mais críticos em relação ao esvaziamento dos órgãos de gestão local: “Nesta última administração, de 2005 para cá, as subprefeituras deixaram de existir”... Para ele, que atua no distrito do Jardim Ângela, “a lei que criou as subprefeituras foi totalmente desrespeitada e centralizaram tudo novamente”.
Maurício Broinizi, da Rede Nossa São Paulo, defendeu que os indicadores sociais de cada distrito e de cada subprefeitura sejam utilizados na hora de se discutir e votar o orçamento do município. “Deixo aqui um desafio para a Câmara Municipal, no sentido de que sejam revistos os critérios de distribuição dos recursos da cidade”, propôs. De fato, a maioria dos distritos tem pouquíssimos equipamentos públicos e carências imensas, o que é sentido pelos moradores das diversas regiões, mas nem sempre é efetivamente enfrentado pelo poder público. E mesmo quanto há um plano de metas, o atendimento das promessas nem sempre chega aos lugares mais distantes.
Mas talvez o melhor resultado do Seminário tenha sido colocar em pauta a questão da importância de uma retomada da descentralização com subprefeituras estruturadas, não apenas com recursos, mas também com a almejada participação social. Nesse sentido, os vereadores José Police Neto (PSD), presidente da Câmara Municipal, e o vereador Ítalo Cardoso (PT), anunciaram, nessa ocasião, gestões junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de derrubar a ação direta de inconstitucionalidade que impede a instalação do Conselho de Representantes nas Subprefeituras: “Nosso objetivo, explicou Police Neto, é convencer o Supremo Tribunal Federal de que houve um equivoco do Ministério Público ao propor a ação direta de inconstitucionalidade”.
Felizmente o término do mandato da atual legislatura está abrindo espaço para a discussão de aspectos importantes para o futuro de nossa cidade. Nas próximas semanas estes assuntos continuarão na pauta, ao avaliar a execução do Plano de Metas municipal.
*Professor da PUC-SP, colaborador da Pastoral Fé e Política e da Escola de Governo de São Paulo
Programa Igreja em Notícia apresentado na Rádio 9 de julho em 09/05/2012, um espaço da Pastoral Fé e Política da Arquidiocese de São Paulo.
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