No mapa abaixo de São Paulo pode-se observar o progressivo aumento dos coronéis que estão hoje no comando de 29 das 31 subprefeituras da cidade, mapa feito de julho de 2008 até novembro de 2011.
Você sabia que todas as subprefeituras da cidade de São Paulo têm o tamanho, no mínimo, de uma cidade média brasileira? A zona leste, por exemplo, tem quatro milhões de habitantes e onze subprefeituras. O cargo de subprefeito é de livre escolha do prefeito. Veja o tamanho da responsabilidade de um subprefeito e de um prefeito ao escolhê-lo. Temos observado que durante várias gestões, subprefeito é um cargo de barganha política. E não é um problema de um único partido e sim de um sistema equivocado e antiquado de fazer política. Apoio de vereadores ao executivo têm como troca a nomeação de algum indicado de algum vereador. São verdadeiros feudos. Se não é o subprefeito diretamente o indicado, os principais assessores são de algum vereador. E esta garantia é fundamental para o subprefeito assumir ou permanecer no cargo. Caso não tope, no caso atual, pegue seu quepe e vá embora. Já tivemos a era dos ex-prefeitos do interior do estado de São Paulo como subprefeitos, que vinham com sua experiência administrativa gerir interesses que absolutamente desconheciam. Afinal, como exemplo análogo, posso ser um excelente piloto de avião mas, não conheço tudo sobre qualquer tipo de voo: como helicópteros, pássaros e naves espaciais. Parece que o caso agora é peculiar. O prefeito vem tentando controlar as subprefeituras com coronéis aposentados da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Nada contra os coronéis pessoalmente. Acredito que muitos sejam muito bem intencionados. Alguns até dispostos a ouvir a população. Mas, me causa estranheza este corporativismo em um cargo. A justificativa é que os coronéis vão moralizar as subprefeituras, o que nos leva a concordar que nas subprefeituras valores republicanos e, portanto, éticos, como cumprimento dos horários de trabalho, mal uso do dinheiro público, ineficiência na fiscalização e abuso de poder, além de pequenos interesses de grupos, são arroz com feijão cotidiano. Em época na qual a palavra corrupção está em moda, parece que devemos como cidadãos atentar para os focos. Lembro do economista e professor Odilon Guedes em sua passagem pela subprefeitura do Jabaquara, quando resolveu exigir o básico: cumprimento do horário dos servidores.
Em quinze dias o estoque de cafezinho acabou pois os funcionários "obrigados" a cumprir horários consumiram o estoque de um mês de café em apenas 15 dias. Os coronéis têm na sua história um profundo conhecimento em estabelecer hierarquias. Mas, são muito pouco conhecedores de processos democráticos de gestão. Participação não é uma palavra forte na caserna. Nem os dados da área de segurança conseguimos ter com transparência nesta cidade. Qual o recado que é passado para o cidadão tendo coronéis a frente do equipamento público que deveria ser o mais próximo do cidadão? Tem alguém que manda aqui (mas quem deveria mandar é o soberano!). Será que um cidadão vai sentir que a subprefeitura é seu espaço e ele sente que tem livre acesso a ela? Em geral, a população tem medo da polícia devido a sua truculência. Herança de muitas ditaduras no nosso país. E os coronéis inibem o cidadão, principalmente os menos cientes de seus direitos, por exatamente serem da polícia. O espaço da subprefeitura (na verdade temos hoje administrações regionais), deveria ser o local mais acessível possível ao cidadão. Deveria ser o espaço público no qual as pessoas daquela área poderiam ajudar a administrar. Na lei das subprefeituras temos este espaço garantido pela eleição em cada subprefeitura de um grupo de cidadãos (Conselho de Representantes) que iriam ajudar a estabelecer ações, planejar e fiscalizar a atuação do poder público naquela subprefeitura, distritos e/ou seus bairros. O prefeito Kassab se comprometeu com a Rede Nossa SP, na sua eleição, com dez pontos nos quais o candidato a prefeito se comprometia em estabelecer na cidade. O primeiro destes pontos é o Conselho de Representantes. Foi criada uma Frente Parlamentar Pró-Conselho de Representantes na Câmara Municipal paulistana (apoiada por 27 vereadores, inclusive da base do prefeito) e dezenas de entidades da sociedade civil, que construiu um projeto de lei para finalmente termos este espaço cidadão - os conselhos de representantes - em cada subprefeitura. Foi apresentado aos assessores do prefeito. Até agora nada. O prefeito estará em um mês entrando no seu último ano de gestão e não dá sinal algum de que vai cumprir o que prometeu. Quem obviamente mais sofre com ter subprefeitos "estrangeiros" é a população das periferias. Em apenas um ano tivemos quatro subprefeitos passando por uma subprefeitura da zona sul. Caso não raro em outras. Além disto, os orçamentos das subprefeituras e seus poderes vêm diminuindo a cada ano. Já foi quase 25% do orçamento locado nas subprefeituras e agora é por volta de um quinto disto. Para resolver esta questão temos que mudar o modelo municipal de gestão e o sistema político no Brasil. Dois vespeiros que a população só verá modificado e colherá os frutos quando enfrentar, conhecer, influenciar e principalmente pressionar e exigir quem está no poder. O primeiro já foi dito: implementar os conselhos de representantes em cada uma das 31 subprefeituras. Junto disto é preciso transformar estas "administrações regionais" , isto é, zeladorias em subprefeituras. Para isso é preciso descentralizar a administração municipal novamente: os serviços e orçamento. Com estas duas ações de abertura da coisa pública (res-publica) ao público corrigiríamos muitas injustiças na cidade: acesso ao Estado de quem mais precisa de sua intervenção. Isto se chama equidade. Tratar os diferentes com diferenças para dar a mesma oportunidade a todos. Mas, estas duas coisas se não acompanhadas de uma alteração na forma de escolha de subprefeitos de nada valeria. Precisamos eleger subprefeitos. Isto regularia o saber administrar com o conhecimento local do gestor. Dizem que isto enfraqueceria o prefeito e criaria problemas de gestão. Prefeito de um partido e subprefeito de outro. Partindo desta lógica teríamos que ter o mesmo partido na gestão de todos os executivos. De Campo Limpo Paulista até a Presidência da República um só partido, passando por todos os estados brasileiros e prefeituras. Isto não é democracia, é ditadura. O problema não é enfraquecer o prefeito. É enfraquecer o patrão do prefeito que é o povo, verdadeiro soberano. Este soberano está aniquilado da subprefeitura. Uma cidade de 11 milhões e 300 mil habitantes não pode ter seus problemas resolvidos de forma centralizada e sem a participação da população. É vesguice política acreditar nisto! O outro ponto fundamental é mudarmos a forma de elegermos nossos representantes dos legislativos. O sistema atual de lista aberta, isto é, um partido nos apresenta uma série de candidatos desligados uns dos outros. Quem tiver mais votos se elege. Eles lutam pelos mesmos votos. Se um tem uma base em um determinado bairro que ninguém ouse se aproximar. Depois do prefeito eleito ele terá o que negociar com o prefeito. "Este bairro aqui eu tive x votos e para eu apoiá-lo preciso colocar os meus na subprefeitura!"(e outros espaços da administração municipal). Mudando o sistema eleitoral para um sistema de lista fechada, isto é, o partido estabelece uma ordem na lista e não se vota mais em nomes e sim em partidos, daríamos um golpe fatal nesta barganha. Os que temem este sistema que se encontra numa campanha (www.reformapolitica.org.br) afirmam que o caciquismo imperaria. Os “donos” do partido beneficiariam somente os seus. Mas, quem disse que isso não acontece hoje? A divisão dos recursos nas campanhas e o tempo dado para cada candidato na televisão e radio já está na lógica do caciquismo. Quem passou por algum partido em eleição sabe bem disso. O problema dos coronéis a frente das subprefeituras não é a despolitização do processo de escolha. Não se iluda. Porque este é um processo politizado. É um processo de escolha que acredita que a democracia é só representativa, isto é, quem é eleito é rei, pode fazer o que quiser, se torna o soberano. E os coronéis da PM de São Paulo representam bem isto pois, no seu brasão conta com diversas estrelas que falam de ações que reprimiram movimentos populares (veja o site da corporação), movimentos democráticos, isto é, dos soberanos: o povo. A democracia que acreditamos e lutamos e que se vincula diretamente com os movimentos que pipocam hoje pelo mundo todo, como em Nova Iorque e outras cidades norte-americanas, como o movimento na Espanha, na luta dos estudantes chilenos, na primavera árabe e os movimentos sociais engajados aqui no Brasil (inclusive os que andam ocupando nossas praças), é que a democracia é o equilíbrio da democracia representativa com a participativa e direta, que está expressa no primeiro artigo da Constituição Brasileira. Quando elegemos alguém para nos representar ele é o nosso empregado (como sempre gosta de lembrar o Professor Fábio Comparato) e ele não pode resolver tudo sozinho, seja no executivo ou nos legislativos. O eleito não leva um cheque em branco consigo. Ouvir a população, não só na eleição, não é uma escolha nas democracias do século XXI, é uma obrigação. Plebiscitos e referendos são praticas que devem se tornar cotidianas (na Suiça a cada quatro meses a população opina sobre algo). Participar não é só um direito do cidadão, é um dever. Vamos eleger os subprefeitos em São Paulo e melhorar a gestão pública nas subprefeituras!?
*Psicólogo e acupuntor, é diretor da Escola de Governo de São Paulo.
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