terça-feira, 13 de julho de 2010

QUAL A INFLUÊNCIA DA FÉ NA POLÍTICA?

Essa pergunta foi feita ao Cardeal emérito de Milão, Carlo Maria Martini, em diálogo com o Pe. Georg Sporschill, que desenvolve um belo trabalho com meninos de rua na Romênia e na Moldávia. Ambos se encontraram em Jerusalém e passaram noites inteiras em perguntas e respostas. Uma das perguntas foi exatamente esta: Qual a influencia da fé na política?
O Cardeal respondeu: "Como cristãos, olhamos para Jesus. Ele é o fundamento de algo totalmente novo: a Igreja. Jesus realiza a missão de Deus ao criar um segundo instrumento para a paz, ao lado do povo escolhido primeiramente, o povo de Israel. Com isto Jesus se coloca na linha de frente. Jesus enfrentou todas as autoridades políticas: Herodes, Pilatos, o Sinédrio, os partidos dos fariseus e dos saduceus. Ele lutou apaixonadamente pela justiça e queria mudar o mundo. A Igreja de Jesus Cristo deve trabalhar para que o mundo se torne mais justo e mais pacífico.

Segundo a Bíblia, a justiça está acima do direito e da misericórdia: é um atributo fundamental de Deus. Justiça significa comprometer-se com os desprotegidos. Justiça significa intervir de forma ativa e ofensiva por uma convivência onde todos vivam em paz. A Justiça deve vigiar para que o direito, tal como está formulado nas leis, possibilite uma vida digna para todos. Jesus deu sua vida pela justiça. Procurou o diálogo com os poderosos... e eles se sentiram incomodados por Ele.
Jesus se pôs do lado dos pobres, dos sofredores, dos pecadores, dos pagãos, dos estrangeiros, dos oprimidos, dos famintos, dos presos, dos humilhados, das crianças e das mulheres. Quem se põe do lado das pessoas sem pastor, quem as reúne e as conscientiza, se torna perigoso para os detentores do poder. Sempre que cristãos assumem a opção pelos pobres feita por Jesus, devem ainda hoje contar com perseguições" (Diálogos Noturnos em Jerusalém, pg.149-150, Paulus).

O princípio de que "a fé sem obras é morta" permanece como grande desafio do testemunho pessoal e social dos cristãos, e exige um efetivo compromisso na transformação das estruturas injustas que oprimem e matam a vida dos indefesos. Os bispos do Brasil, ao celebrar os 500 anos de Evangelização, escreveram: "Desejamos, confiantes, renovar a nossa fé.
Proclamamos que Jesus Cristo é a nossa esperança. Sua presença no meio de nós é a garantia de que a semente do Evangelho jamais será sufocada ou destruída pelas forças do mal. Ela é destinada a tornar-se a espiga que dará muitos grãos e a árvore que oferecerá abrigo a muitas aves" (Doc. CNBB 65, nº 63). A semente da Palavra de Deus em nossos corações é a certeza de uma sociedade justa, solidária e repleta de fraternidade.

A fé cristã une estreitamente o amor a Deus ao amor aos irmãos. Um não pode ser autêntico sem o outro. "Se alguém disser: amo a Deus, mas odeia seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama seu irmão a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê" (Jo 4,20). Em outras palavras: "O Evangelho do amor de Deus pelo homem, o Evangelho da dignidade da pessoa, e o Evangelho da vida são um único e indivisível Evangelho" (Doc. CNBB, nº 65). Por isso a fé tem tudo a ver com a política, que tem como primeira e mais importante missão a busca do bem comum de todos e a luta pela justiça social. Sem a fé nos tornamos ditadores dos outros e de nós mesmos.

Dom Anuar Battisti
08 de Julho de 2010 11:37

site cnbb.org.br

5 comentários:

  1. Diante de um texto objetivo como esse como explicar que boa parte da igreja católica, notadamente nos grandes centros, caminha indiferente com o sofrimento de tantos irmãos, cultuando um deus egóico, lotando templos de "fiéis-clientes" que se preocupam com o próprio umbigo?

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  2. Concordo com o comentário anterior. Basta verificar que em grande parte das igrejas dominadas por essa postura, é celebrada periódicamente uma missa cuja chamada nivela (por baixa) com as neopentecostai$$$$$$$$$$$. Quem tiver dúvida confira.

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  3. Agradecemos os comentários. Esperamos que ao conhecer um pouco os textos de nosso blog possam notar que além dessa igreja que citaram, de pessoas que buscam a fé individualista, temos muitas outras pessoas que estão em busca do bem-comum. Sabemos e reconhecemos muitos dos erros de nossa igreja, mas a Fé que nos move é maior e nos faz permanecer firmes na busca de aponta-los e buscar solucioná-los. Pode acreditar que isso não é fácil. Seria muito mais fácil sair.

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  4. Partilho contigo amigo Flávio. O diálogo quer seja de carater ecumenico, quer seja inter-religioso, quando respeitoso é construtivo. Os comentários acima mexem em uma ferida que purga e esta ai, é visível. Uma grande parte da nossa igreja esta descomprometida, é individualista. A grandeza esta em não somente reconhecer os erros, mas caminhar em meio a eles, sem se deixar contaminar, e nunca, nunca deixar de profetizar. Profetizar anunciando e denunciando tudo aquilo que se opoem para que a justiça e a paz se abracem conforme orienta o salmista.

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  5. Por um erro meu, o comentário acima deste foi publicado anonimamente. Assumo a autoria.

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